quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Há ruas do centro de Braga onde praticamente não vive ninguém

Desertificação do centro da cidade e degradação dos prédios preocupa bracarenses. Derrocada do mês passado reacendeu a discussão sobre reabilitação urbana

Embora Braga esteja a revelar a sua faceta mais jovem e inovadora, o lado negro do centro da cidade tem escapado às objectivas. No início de Setembro, um desabamento na Rua dos Chãos, junto à Avenida Central, vitimou três trabalhadores da construção civil e reacendeu a discussão em torno da renovação urbana.

"Há ruas do centro de Braga onde praticamente não vive ninguém." O alerta é de Miguel Bandeira, professora de Geografia na Universidade do Minho (UM) e dirigente da associação de defesa do património Aspa. Ninguém conhece ao certo o número de casas degradadas e devolutas no centro de Braga, mas a voz corrente na cidade aponta para cerca de uma centena. A autarquia considera o número exagerado. "São seguramente menos de 100", assegura o vereador Carlos Malainho. Mas a verdade é que entre a Rua D. Pedro V, a Rua do Souto, a Avenida da Liberdade e a zona da Sé existem largas dezenas de prédios degradados, alguns devolutos e a anunciar ruína.

Os únicos números oficiais são os dos Censos de 2001, que diziam existir 10 mil fogos desabitados em Braga. Miguel Bandeira arrisca num número superior: "Hoje, existem pelo menos 15 mil casas desocupadas." "Braga é uma cidade antiga, com um núcleo de edificado em que predominam os prédios com mais de 50 anos", explica. E há factores de agravamento, como o envelhecimento da população e o despovoamento do centro histórico, que explicam o actual panorama dos imóveis bracarenses.

O geógrafo aponta responsabilidades à autarquia. "Não tem sido promovida uma reabilitação do núcleo urbano", critica. E considera que muitas das reabilitações que se têm feito são "restauros de fachada": "Apenas se mantém a fachada e todo o valor patrimonial do edifício é destruído." Bandeira defende que a autarquia premeie os proprietários para incentivar a reabilitação urbana.

A Câmara de Braga queixa-se de não ter autonomia para uma maior intervenção. "Estamos atentos, mas não podemos entrar nas casas sem autorização dos proprietários", assegura Carlos Malainho, vereador com o pelouro da Protecção Civil. "Esta é uma situação que preocupa a câmara", garante o vereador, revelando que a autarquia tem intervido nas situações que oferecem maior risco.

Os sinais de alarme, no entanto, chegam de vários quadrantes, incluindo dos bombeiros da cidade. "A situação das casas degradadas preocupa-nos imenso. Quando tudo falha a montante, sobra para os bombeiros", considera António Machado, presidente dos Bombeiros Voluntários de Braga.

Manuel Pereira, dos Sapadores locais, concorda e alerta: "A Rua dos Chãos nem é a zona mais problemática da cidade. A zona da Sé é um verdadeiro barril de pólvora." O presidente da junta de freguesia da Sé, José Alberto Silva, tem vindo várias vezes a levantar a questão. Ao todo, na freguesia do núcleo histórico de Braga, a junta de freguesia tem contabilizados 20 prédios degradados. "Esta é a freguesia que tem mais prédios em situação perigosa", anuncia, referindo quatro casas em risco iminente de ruína e "uma dúzia às quais um Inverno rigoroso pode colocar na mesma situação". Bombeiros queixam-se de falta de formação e de equipamento para derrocadas.

Os Bombeiros Sapadores de Braga lamentam não ter todas as condições para o socorro de acidentes na zona urbana. "Temos necessidade de ter um nível específico de formação que não temos para o salvamento em edifício desmoronado e um carro preparado para fazer escoramentos", afirma Manuel Pereira, delegado sindical dos Sapadores.

Os receios dos bombeiros
Os bombeiros temem que ocorram situações do género da que, no início do mês, vitimou três trabalhadores na Rua dos Chãos, e alertam para o facto de lhes faltar um braço mecânico de grande alcance e uma viatura de pequenas dimensões para combate a fogos urbanos. Mas o corpo dos Sapadores, constituído por 78 homens, conta com equipamento de protecção individual para cada elemento. "A câmara tem feito esse esforço", reconhece Manuel Pereira.

A autarquia investe na corporação cerca de um a dois milhões de euros anuais. Por isso, Carlos Malainho acredita que existem "os meios suficientes para as necessidades".

O autarca defende-se das queixas de falta de formação, afirmando que a autarquia contrata formadores sempre que entende que está disponível uma formação pertinente: "Temos todas as condições para dar formação no nosso quartel e sempre que é possível fazemo-lo."

Malainho entende que também não faz sentido falar-se em falta de meios para fogos urbanos. "Estamos bem equipados, com carros novos. O que falta é uma viatura de combate a fogos florestais." Braga é a única cidade do país com bombeiros profissionais e uma corporação de bombeiros voluntários.

António Machado lamenta que os Voluntários de Braga disponham apenas de um carro antigo para incêndios urbanos com mais de 20 anos. Além disso, falta um autotanque de grande capacidade. Mas se as viaturas algum dia forem compradas não têm onde ser guardadas, pois o actual quartel é pequeno. Existe terreno para um novo edifício, mas não há financiamento, pelo que a corporação apresentou uma candidatura para incluir esse investimento no QREN.

Samuel Silva, no PÚBLICO